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Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, volume 1, número 2, junho de 1998
Editorial
A Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental foi lançada no III Congresso Brasileiro de Psicopatologia Fundamental, realizado de 24 a 26 de abril de 1998.
Artigos
Quando os psicofármacos fazem confundir melancolia e depressão
Rubens Coura
A atual busca de aproximação com psiquiatras, por iniciativa de muitos psicanalistas, é em parte resultante de uma peculiar idealização da psiquiatria efetuada por esses mesmos psicanalistas – enquanto as populações em geral idealizam a Medicina como um todo, tanto uns como outros em decorrência do mesmo fascínio pela tecnologia que tornou possíveis os novos antidepressivos.
Tanto essas idealizações efetuadas pelas coletividades em geral, como aquelas análogas feitas por psicanalistas, fazem parte de uma verdadeira ideologia da produtividade – que implica uma escalada obsessiva (e não melancólica nem depressiva) da sociedade. Estamos atravessando uma era na qual se repetem as características da neurose obsessiva – numa identificação mútua baseada no esforço coletivo rumo a um estado de perfeita e perpétua saúde do corpo.
A aproximação mais desejável parece ser a de psicanalistas com os médicos em geral (sem exclusão dos psiquiatras), principalmente dentro dos grandes hospitais gerais, por ser neles que ocorrem as mais eloqüentes demandas de médicos por uma escuta psicanalítica que os ajude a entender as solicitações desmesuradas que lhes são feitas para a obtenção dessa saúde plena e dessa “nova religião” pela imortalidade do corpo.
Psicopatologia/Metapsicologia. A função dos pontos de vista
Pierre Fedida e Patrick Lacoste
Para o autor, é evidente que existe uma psicopatologia freudiana e que sua referência é incontornável. No entanto, é fato que as características de sua “bandeira” permanecem imprecisas à medida que se negligencie o “metapsicológico” que compreende seu discurso. É preciso acrescentar também que o uso feito pelos psicanalistas do termo “metapsicologia” não está protegido das fortes influências ideológicas, em virtude das aspirações da psicanálise à “cientificidade”.
Aproximando metapsicologia e psicopatologia, o autor trabalha a que ele considera como a invenção de uma perspectiva até então desconhecida, de uma perspectiva que define seu objeto indicando a posição do sujeito que observa: perspectiva do aparelho psíquico há muito anunciada e posteriormente definida em termos de pontos de vista.
A paixão da causalidade: uma fala em causa?
Roland Gori
Este artigo coloca a questão de saber de onde provém a necessidade de se buscarem causas psicológicas para o sofrimento e para a doença, transformando o pathos dessas experiências cruciais na busca de uma explicação aceitável pela razão. Partindo de fragmentos clínicos e da análise do texto de Tausk sobre “a gênese do aparelho de influenciar” na esquizofrenia, o trabalho visa explicitar a especificidade da posição psicanalítica em relação às proposições psicológicas (por vezes influenciadas pela própria psicanálise), de caráter explicativo e “compreensivo”, face a esta questão.
Propõe-se que “a tendência causalista em psicanálise constitui uma resistência ao próprio método psicanalítico” e que é exigido do psicanalista um trabalho particular de luto constituindo na renúncia à pretensão aos sentidos estabelecidos de uma vez por todas em benefício de se admitir; a partir do contexto da situação psicanalítica, que podemos “sofrer sem razão” e que nosso pensamento se forma “do encontro de nosso desejo com alguns fragmentos, retos de palavras e fonemas”.
Conclui-se que a necessidade de se encontrar causas psicológicas para o sofrimento decorre da própria experiência originária de aquisição da linguagem, tempo mítico durante o qual um único aparelho de linguagem funcionou para dois corpos, fundador da relação desnaturada do ser humano com seu próprio corpo, para a qual o eu busca – desesperadamente – uma explicação definitiva.
Um não cedo demais. Investigações teóricas a respeito da psicossomática e da melancolia de um caso clínico
Maria Cristina Zandoná Portela
O artigo vai abordar, a partir do estudo de um caso clínico, questões relativas à melancolia e à psicossomática. Com relação a esta última, a premissa é de que os fenômenos psicossomáticos podem ser entendidos enquanto efeito do inconsciente sobre o próprio corpo e são inseridos no campo da linguagem. Na ótica lacaniana são vistos enquanto manifestações no simbólico – defeito de filiação simbólica. Importante também neste enfoque é a questão dos significantes com relação à origem dos fenômenos psicossomáticos.
Significantes que muitas vezes foram impostos ao sujeito e que não encontram articulação no registro do simbólico, sendo o corpo a única possibilidade de inscrição do inconsciente.
Com relação à melancolia, além da reação frente a perda do objeto amado, será abordado também aquilo que ficou do objeto, ou seja, aquilo que o sujeito carrega dentro de si como um corpo estranho e que muitas vezes se confunde com si mesmo.
A AIDS numa cultura de falsos-selves
Renate Meyer Sanches
Partindo da discussão das diferenças na visão de cultura em Freud e Winnicott, o texto procura situar o significado dos mitos e dos tabus. Neste contexto insere-se a questão da AIDS Social: um conjunto de representações, pré-conceitos e posturas ligados à AIDS, que tem a função de criar barreiras à mesma: sexualidade “ilícita”, destrutividade, impotência e morte.
Situa-se a questão da AIDS Social como produto de uma cultura que vem sendo caracterizada como narcísica: discutem-se as características da mesma, relacionando-a especificamente a traços da cultura brasileira e reposicionando-a, numa leitura winnicottiana, como uma cultura de falsos-selves. A AIDS é colocada como, simultaneamente, um produto e uma denúncia (portando, um sintoma) dessa cultura.
Modelos en psicoanálisis
Flora Singer
La división inaugural entre conciencia e inconsciente remite a una alteridad del psicoanálisis, que funda su ontología, y alcanza sus nociones, sus modelos y sus criterios de cientificidad.
Esta alteridad requiere ser abordada desde una racionalidad específica: una lógica de la paradoja, que permite aprehender los contrarios constituyentes de la alteridad como complementarios y no excluyentes.
La autora desenvuelve la cuestión de como la intrincación entre lo mismo e el otro deviene tan compleja, excediendo a una comprensión racional neta, no habiendo límites precisos entre una carga de sentido e otra nueva. Ésto, que para ella, es la capacidad creativa de las nociones en psicoanálisis, es necesario para bordearse un objeto que no cesa de ofrecer resistencias e emprender una reflexión acerca de la especificidad de los modelos en psicoanálisis e del diálogo interdisciplinario.
La autora cree que la paradojalidad así como lo negativo delimitan una epistemología específica para el psicoanálisis, y cuando integra en el ámbito universitario, la explicación de sus modelos y del uso lógico que se hace de ellos puede realimentar la propia reflexión con elementos que contribuyan a la especificidad de la metodología de la investigación.
Gene real, gene imaginário: uma perspectiva fantas(má)tica da hereditariedade
Rubens Marcelo Volich
A experiência clínica revela que, mesmo diante da doença orgânica, a referência exclusiva à anatomia, à fisiologia ou mesmo à genética não é suficiente para compreendermos o sofrimento de nossos pacientes. Para alcançarmos a essência deste sofrimento, é necessário que consideremos que, a partir do corpo real, anatômico, fisiológico, configura-se um outro corpo, um corpo imaginário, que se constitui, a partir do desamparo primordial, através da relação com um outro ser humano. Segundo esse processo, a criança constitui sua subjetividade, tornando-se um ser desejante, social, da cultura. A dissociação entre corpo anatômico e fisiológico e o corpo imaginário instaura um fissura através da qual se esvai a subjetividade, preparando o caminho para a experiência melancólica. Essa perspectiva revela que o adoecer comporta uma dimensão identificatória e intersubjetiva. A doença de indivíduo repercute, obrigatoriamente, no conjunto familiar através da genealogização do sintoma e do remanejamento das representações transgeracionais. Desta forma, é importante considerarmos essas experiências para compreendermos que o risco genético real, revelado pela ciência, é permeado pela vivência de um risco imaginário que determina as representações individuais e sociais da doença, e mesmo, em alguns casos, as possibilidades de sua manifestação bem como seus curso.
Tensão pré-menstrual – loucura feminina?
Vera Aparecida de Carvalho Zoldan
A Síndrome da Tensão Pré-Menstrual surge em nossos dias como a “síndrome da mulher moderna”. Marcando uma diferença sexual, cada vez mais difícil de ser simbolizada pelas mulheres de nossa época, os sintomas da STPM mostram-se incompreensíveis para suas vítimas, incuráveis para os médicos, “loucura feminina” para a sociedade. Porém, à luz dos conflitos pré-edípicos descritos por Freud, assim como da problemática da pré-puberdade, em Helene Deutsch, até a leitura lacaniana do gozo feminino, a tensão pré-menstrual revela-se pela emergência do rela como “tensão pré-simbolizante” – esforço imposto a toda mulher pela impossibilidade de dizer seu sexo, de definir-se a partir da função da maternidade como criadora de seus próprios significantes.
Resenha de Livros
Pátio de miragens
Rubens Marcelo Volich
O estrangeiro
Caterina Koltai (org.)
São Paulo: Escuta, 1998.
O naturalismo psiquiátrico
Mario Eduardo Costa Pereira
Historia de las ideas psiquiátricas: el naturalismo psiquiátrico
Jorge J. Saurí
Buenos Aires: Lohlé-Lumen, 1996.
Resenha de Artigos
Fundamentos da neurobiologia e concepção neurobiológico da psicopatologia
Mario Eduardo Costa Pereira
A new intellectual framework for psychiatry
Eric Kandel
American Journal of psychiatry
April 1998, 155:4, p. 457-469
Preocupação com a diminuição da pesquesia clínica em psiquiatria
Mario Eduardo Costa Pereira
Editor’s comment: “The crisis in clinical research”
American Journal of psychiatry
April 1998, 155:4, p. 455
O espectro autista
Mario Eduardo Costa Pereira
The autistic spectrum
Lorna Wing
The Lancelot
V. 350, n. 13. December 1997, p. 1761-1766
Autismo e aberrações derivadas do cromossomo 15q Mario Eduardo Costa Pereira |
Autism and maternally derived aberrations of chromosome 15q
Richard Schroer et alli
American Journal of Medical Genetics
76, 1998, pp 327-336
Serotonina e transtorno afetivo bipolar: haveria alguma ligação entre eles?
Mario Eduardo Costa Pereira |
Serotonin transporter (5-HTT) gene and bipolar affective disorder
Lisa Esterling et alli
American Journal of Medical Genetics
81, 1998, pp. 37-40